O projeto de lei que altera os processos de falência e recuperação judicial tem boas intenções, mas não houve o devido diálogo com a comunidade que estuda os temas para a elaboração do texto, que contém uma série de problemas.
Essa é a perspectiva do professor de Direito Empresarial da Universidade de São Paulo Francisco Satiro, que falou sobre o PL 3/2024, apresentado pelo Poder Executivo. O texto foi aprovado nesta terça-feira (26/3) a partir de relatório da deputada federal Dani Cunha (União Brasil), filha do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha.
Instituições ligadas à advocacia, ao Ministério Público e à própria magistratura emitiram notas oficias com críticas ao projeto. A criação de uma nova figura — o gestor fiduciário — e uma concentração de poder nas mãos dos credores têm sido pontos citados como sensíveis.
“O projeto tem uma redação com uma série de problemas e incongruências. Então, com mais tempo, e uma discussão maior com o mercado e com aqueles que trabalham com isso, é possível ter um resultado positivo. A ideia do ministério da Economia é excelente, é necessário melhorar o resultado da falência. O que se precisa, simplesmente, é se dedicar a uma redação que seja compatível com os objetivos”, afirma Satiro.
Interesses distintos
Em relação aos credores, o professor cita que a lei os trata como se eles constituíssem instituição uníssona, o que não tem amparo na realidade, tendo em vista que há vários tipos de credores com interesses diferentes.
“A lei trata credores como se fossem uma categoria única e sem conflitos”, diz o professor.
“Existe uma enorme e vasta gama de conflitos entre os credores e isso precisaria ser devidamente acertado, haja vista que, na proposta, o gestor fiduciário é contratado por alguém por parte dos credores para um determinado fim. Isso pode vir a prejudicar outros credores.”
A fala foi proferida durante o II Ciclo de Debates sobre Insolvência Empresarial, que aconteceu na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no Largo São Francisco. Além do PL, o professor também comentou a possibilidade de serem fechadas as varas especializadas que tratam de falências.
“As varas especializadas são referências para o país. Boa parte do que temos de jurisprudência e que se aplica à lei de falência é formada pelas varas especializadas, foi forjada dentro das varas, e matéria de falência e recuperação judicial é extremamente hermética, especializada, interdisciplinar, demanda uma série de outros conhecimentos e, sob o meu ponto de vista, a estrutura de varas especializadas é ideal para possibilitar um resultado melhor para o jurisdicionado.”